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quarta-feira, 29 de setembro de 2021

ALLAN KARDEC ERA RACISTA?

 

"Acusar Allan Kardec de racista é, ou falta de conhecimento, ou leviandade. Talvez, as duas coisas".


Mais comum do que deveria é o indivíduo fazer a leitura de qualquer escrito e partir para o ataque. Certamente, ao ler a afirmação acima, se o (a) leitor (a) tiver uma ideia formada sobre o assunto, possivelmente já julgou esse escriba.

Antes, então, ofereça o benefício da dúvida, e busque tirar conclusões após receber o conjunto de informações que passamos a compartilhar a partir de agora.

Por ocasião do ano de 1862, Allan Kardec fez publicar na Revista Espírita do mês de Abril um artigo trazendo o título: frenologia espiritualista e espírita - perfectibilidade da raça negra.

Uma longa elaboração foi feita por seu autor. Mas, o furor manifesto ocorre em razão do título e, ao depois, pelo conteúdo do artigo. É que, novamente, mais comum do que se deveria, busca-se o isolamento de parte do texto com o qual se filia ou se refuta. No caso daquele artigo, o objetivo dos críticos é atacar o seu autor sem, no entanto, considerar o que segue:

1. Quem é o autor do artigo?

2. Qual o tema central?

3. Por que escreveu?

4. Qual era o contexto em que o artigo foi escrito?

5. Qual o público-alvo do artigo?

6. Quando escreveu ou publicou?

7. Onde publicou?

8. Quais áreas do conhecimentos são necessárias para analisar o artigo?

9. Quanto conheço daquela época, do ponto de vista histórico?

10. Os meus conceitos ou preconceitos prejudicam uma análise racional do artigo?

Começando pelo título, Kardec refere-se a quatro pontos fundamentais, a saber:

a) Frenologia;

b) Espiritualismo;

c) Espiritismo;

d) Expressão oriunda de dogma católico.

 
(vídeo com apresentação dos slides que estão disponíveis para download na descrição do mesmo na página do YouTube)

Quanto à frenologia, cabe informar que foi criada em 1796 por Frans J. Gall, exercendo certa influência na psiquiatria e psicologia entre os anos 1810 e 1840. Seu rigor metodológico era questionável, considerando-se uma pseudociência pelos autores do século 19.

Essa pseudociência defendia que a forma e protuberâncias do crânio são indicativas de faculdades e aptidões mentais de uma pessoa. Kardec usa-a apenas como um ponto de partida para sua argumentação.

Fazendo uma crítica a essa 'teoria' Kardec vai dizer que "enganar-se-ia redondamente quem acreditasse poder deduzir o caráter absoluto de uma pessoa pela simples inspeção das saliências do crânio". É que essa foi uma das conclusões da frenologia sobre o volume do órgão e do desenvolvimento da faculdade investigada.

A referência de Kardec à frenologia se dá em razão de que, naquela época, dois sistemas radicalmente opostos eram apresentados por frenologistas materialistas e frenologistas espiritualistas.

Os primeiros defendiam uma doutrina monstruosa de que o cérebro secretava pensamentos e esses influenciavam as diversas aptidões do ser humano. Para os espiritualistas, ao contrário, o pensamento é um atributo da alma, não do cérebro, seguindo-se daí que o desenvolvimento de um órgão é efeito, não a causa. Ninguém é apto porque possui um órgão para determinada aptidão; Ele possui o orgão adequado para sua aptidão porque é apto. Duas coisas diferentes.

Nesse ponto, Kardec faz referência de importância capital. Apresenta outra crítica à teoria frenológica. Recordamos que o fato de se acreditar em algo além da matéria não torna o indivíduo espírita. É a compreensão dos princípios espíritas que conduzem a isso. Diante disso, há erro no pensamento do frenologista espiritualista quanto à questão das aptidões.

Na frenologia o cérebro conduz o desenvolvimento das aptidões. Os frenologistas espiritualistas postulavam que a alma comanda o pensamento que desenvolve os órgãos de manifestação. Então, sutilmente, Kardec diz que é preciso explicar porque alguém possui certa aptidão e o outro, educado nas mesmas condições, não a possui, o que ocorre com todas as aptidões.

Insere aí a teoria espírita que explica a criação da alma em tempo diverso da criação do corpo e, para tanto, faz remissão às figuras do sábio do instituto e a do selvagem. Esclarece que pessoas nascidas em meios ingratos e refratários se tornam gênios, enquanto outros que recebem a Ciência desde a infância são imbecis. Trata dos instintivamente bons ou maus, inteligentes ou estúpidos.

A solução possível, afirma Kardec, é a preexistência da alma, sua anterioridade ao nascimento do corpo, ao desenvolvimento adquirido conforme o tempo vivido e as várias migrações percorridas. Destarte, as faculdades inatas tem sua fonte no Espírito, que afeta os órgãos de manifestação, provocando seu desenvolvimento segundo as leis biológicas.

Parece, a essa altura, que o tema levantado por Kardec ficou lateral. Discordamos. Primeiro, porque, de partida, fica consignado no artigo que o assunto referente à perfectibilidade racial é do interesse da humanidade e requer um exame mais cuidadoso e não uma conslusão leviana.

O certo é que Kardec afasta refutações materialistas e espiritualistas e explica o princípio espírita da anterioridade da alma e, claro, a própria reencarnação. O estudante do espiritismo aprende que o ensino dos Espíritos superiores estabelecem os fundamentos de um filosofia racional, isenta dos preconceitos do espírito de sistema. Portanto, no tempo de Kardec, o tema não recebia óbice à sua discussão.

De fato, Kardec dialoga no seu artigo com uma teoria vigente em sua época - um dogma religioso. O tema de tal gravidade afetava interesses econômicos, sociais e humanitários. No preâmbulo do artigo Kardec questinou: deve-se deixar o assunto sem discussão? O certo é que ele enfrenta o debate, atento e sem leviandade.

É preciso não perder de vista a transcrição abaixo do artigo onde Kardec dialoga com a teoria da criação da alma ao mesmo tempo que o corpo. Veja que ele a 'admite' para argumentar. Isto é uma estratégia para desconstrução de teorias que possuem inconsistências internas e é isso que Kardec faz durante o desenvolvimento das ideias para apresentar a ideia fundamental do Espiritismo:

"Com efeito, se a alma fosse criada ao mesmo tempo que o corpo, a do sábio do Instituto seria tão nova quanto a do selvagem. Então, por que há na Terra selvagens e membros do Instituto? Direis que depende do meio em que vivem. Seja". [...] (grifo nosso).

A doutrina espírita possui, como essencial, o caráter progressivo. Tudo o que se apreende carece amadurecimento. Sobre esse tema, perfectibilidade das raças, Kardec trata no capítulo 7 da obra O Céu e o Inferno, que entre outras coisas esclarece: 'A perfeição corporal de raças adiantadas é consequência do trabalho do Espírito; Não há criações distintas".

Para uma análise imparcial do artigo de Kardec é preciso:

I. Considerar a natureza do Espiritismo: a doutrina promove um diálogo entre a cultura humana e a doutrina dos Espíritos.
II. Identificar o tema central do artigo: a opinião supersticiosa e de origem religiosa de que a raça negra não é perfectível porque Deus a criou para figurar numa eterna inferioridade.

Pela importância atribuída por Kardec ao tema, está implícito que essa teoria analisada:
a) Visava explicar a exploração dos negros por meio da escravidão;
b) Ao mesmo tempo em que fazia nascer o preconceito ao lado do interesse.

Kardec se preocupou e não deixou, simplesmente, tudo como estava. Enfrentou, e discutiu o tema com os elementos que possuia. No artigo Kardec opõe o pensamento filosófico ao preconceito de natureza religiosa sobre o negro. Esse tipo de discussão tornaria a ocorrer mais tarde (RE, 1866, sobre a justiça divina na criação de homens selvagens).

Ora, o preconceito existia na sociedade. Certamente havia uma origem. Assentava-se sobre o dogma religioso que não admitia a preexistência da alma, uma vez que Deus, segundo a crença dominante, criava uma alma nova para cada novo ser que nascia.

Não se pode esquecer que na filosofia de Rousseau, conhecida e estudada por Allan Kardec, era preconizado que o que nos diferencia dos animais é a perfectibilidade da alma.

Outra questão de suma importância é que, ao tempo de Kardec, havia, além do conceito das almas criadas iguais, outra que era admitida pela ciência. Tratava-se da divisão da espécie humana em raças (Georges Cuvier, 1769/1832). A teoria, reportando a diferenças geográficas e faciais, dividia a espécie humana em: caucasiana, etiópica e mongólica. Nessa teoria, os etiópicos eram considerados primitivos, enquanto os caucásicos uma raça desenvolvida.

Importa ter em mente a lei moral do progresso. A base da fé racional em Allan Kardec consistia na afirmação de que onde a ciência avançar, o Espiritismo fica com a ciência. Tratava-se de um método de conciliação para não cair no dogmatismo da fé cega. Assim, quando as pesquisas da ciência avançarem, o Espiritismo não a tendo negado, estará em acordo com o seu progresso.

Segundo SUSSMAN (2014, p. 198), aqueles que tinham uma visão poligenista da origem humana acreditavam na criação divina de todas as formas humanas, mas como espécies diferenciadas, e que Adão e Eva eram antecessores apenas dos povos europeus e judeus, mas não dos povos considerados selvagens.

Portanto, possuímos agora um conjunto de informações não presentes no artigo de Allan Kardec, mas que fazia parte da discussão implementada no mesmo. Conhecendo o contexto, é possível ter uma visão mais justa sobre a elaboração contida na publicação.

A construção do pensamento de Kardec considerava a ciência da época, refutava uma pseudociência, o materialismo e o erro dos espiritualistas. Destarte, os negros eram considerados selvagens no tempo de Kardec. Em razão dos fatos da ciência positiva, considerou sua organização física inferior. Sua proposta, consoante o que havia aprendido na ciência espírita, era que como Espíritos estavam na infância espiritual, nas primeiras reencarnações. Como todo Espírito iriam adquirir conhecimentos e evoluir.

Fazemos, agora, um convite à reflexão. Houve erro na conclusão entabulada por Kardec? Podemos responder positivamente. O erro está em Kardec e na Doutrina Espírita? A resposta é negativa, pois, seu ponto de partida foi a construção teórico-científica da época. Mas, a ciência avançou e aquela construção usada no artigo de Kardec estava equivocada. Atualmente, a ciência afirma que não há diferença racial entre os seres humanos e que a capacidade cerebral não se diferencia.

Importa, ainda, salientar que, conforme FIGUEIREDO (2016, p. 365), sobre a teoria expendida por Kardec no artigo os Espíritos nada disseram. Veremos a seguir que a Doutrina dos Espíritos resolvia a questão. Era necessário que houvesse avançao no campo da ciência tradicional.

No entanto, existem diferenças. São as características como a cor da pele causada por questões climáticas, diferenças étnicas e diferenças de origem cultural.

Finalmente, é preciso compreender o artigo e sua publicação na Revista Espírita do século 19, ocasião em que se formulava o corpo de doutrina do Espiritismo.

A Revista Espírita era usada para testar hipóteses, teorias e ensaios. Um terreno de estudo e de elaboração dos princípios, cujos artigos se destinavam a sondar a opinião humana e dos espíritos. Era o local para dar opinião sobre temas de interesse, considerando que a doutrina espírita só adotava uma opinião se fosse justa e rejeitava se fosse falsa (RE, 1868, p. 134). Tudo que não fosse confirmado ou contraditado ficava no campo da opinião pessoal.

O Espiritismo tem natureza de revelação porque os fatos que não são desmentidos possuem caráter de verdade. Essa natureza se revelou no artigo de Kardec, pois a ciência avançou e o princípio fundamental da doutrina se manteve de pé: a evolução contínua e perpétua do espírito.

Para o espiritismo a natureza humana é espiritual, o que supera particularidades das mais diferentes encarnações, seja negro, índio, homem ou mulher. Segundo o espiritismo, todos nós vivemos ou viveremos todas elas.

No ano de 1867, na mesma Revista Espírita, Kardec vai afirmar: "Muito foi dito e escrito contra a escravidão e o preconceito da cor. Tudo quanto disseram é justo e moral; mas não passava de uma tese filosófica. A lei da pluralidade das existências e da reencarnação vem a isto acrescentar a irrefutável sanção de uma lei da Natureza, que consagrava a fraternidade de todos os homens. Tom, o escravo, nascido e aclamado na América, é um protesto vivo contra os preconceitos ainda reinantes nesse país".

Agora, estudando profunda e seriamente a Doutrina dos Espíritos, convido a pensarmos a situação seguinte. Suponha que, evocados os Espíritos, pudéssemos fazer-lhes as questões seguintes. Pelo conjunto da obra, arriscamos a pensar nas prováveis respostas:

1. Os Espíritos tem cor?

R. Não como entendeis. Porque, tendo o ser humano surgido em muitos pontos do planeta, suas diferenças físicas ocorreram em razão de clima, vida e costumes, bem como, ao dispersarem-se pelo globo, se uniram e deram origem a novos tipos.

2. O Espírito que animou um ser humano etíope ou africano poderia animar um caucasiano ou mongólico e vice-versa?

R. Sim, pois são os mesmos Espíritos que animam todos os seres humanos, independente de etnia, credo ou cor. A natureza da humanidade é espiritual e não material.

3. Quando somos Espíritos, preferimos encarnar nessa ou naquela cor?

R. Isso pouco importa; depende das provas que o Espírito escolhe para evoluir e para corrigir imperfeições de seu caráter, uma vez que toda imperfeição, inerente ao Espírito, é de natureza moral.

De concreto, Kardec organizou o item 4 do Livro Primeiro, capítulo 3, Criação, cujo título é Diversidade das Raças Humanas. Nesse conjunto de questões pode-se testificar que, no silêncio dos Espíritos e do público da Revista Espírita quanto ao tema proposto, consignou-se o ensino dos Espíritos advindos de muitos pontos do planeta, em razão da convergência da ampla maioria. Ali ficou patente que NÃO HÁ diferenças e TODOS os seres humanos SÃO IRMÃOS EM DEUS, pois, SÃO ANIMADOS PELO ESPÍRITO E TENDEM AO MESMO OBJETIVO.

Em O Livro dos Espíritos, nos deparamos com a questão 863, donde se conclui que são os seres humanos os responsáveis pelos costumes sociais e não Deus. Todos os seres humanos deveriam se submeter às Leis Naturais (ou Divinas) e não à opiniões alheias para definir as próprias escolhas.

A humanidade ainda age pela conveniência, mas, isso é um ato livre. Qualquer um pode fazer diferente. Sempre que necessário é preciso afrontar a opinião errônea procedente de costumes embasados em preconceitos. O equilíbrio deve ser o alvo da humanidade. Todos os que não sacrificam a própria vaidade, terão contas a acertar com o tribunal de sua consciência.

Os Espíritos nos trouxeram um conjunto de conhecimentos que derivou na Lei Moral de Igualdade, questões 803 e seguintes de O Livro dos Espíritos. Todos tendendo para o mesmo fim, submetidos às mesmas leis naturais, sujeitos às mesmas dores, experimentando experiências em classes sociais, ninguém recebeu superioridade natural em detrimento de outro, nem pelo nascimento, nem pela morte. Todos são guais perante Deus.

Arremata o pensamento que buscamos elaborar, porquanto a questão da escravidão nos conduz aos preconceitos de todos os matizes, e, sem dúvida, à questão do trabalho, a seguinte informação contida na Questão 812 da obra comentada: 'o bem-estar é relativo e cada um poderia gozá-lo, se todos se entendessem bem. Porque o verdadeiro bem-estar consiste no emprego do tempo de acordo com a vontade, e não em trabalhos pelos quais não se tem nenhum gosto. Como cada um tem aptidões diferentes, nenhum trabalho útil ficaria por fazer. O equilíbrio existe em tudo, o ser humano é quem o perturba'.

Essas, portanto, são nossas considerações sobre a imperfeição moral atribuída por muitos a Allan Kardec em relação ao seu artigo publicado no periódico espírita do século 19, quando adjetivado de racista.

Uberaba-MG, 29 de Setembro de 2021.
Beto Ramos.

BIBLIOGRAFIA:
FIGUEIREDO, Paulo Henrique de. Revolução Espírita - A teoria esquecida de Allan Kardec. São Paulo: MAAT, 2016.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.
KARDEC, Allan. Revistas Espíritas.
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.
KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno.
KARDEC, Allan. A Gênese.
- Para informações sobre, acesse: FRENOLOGIA .
- Para informações sobre a visão poligenista da criação - humana, acesse: POILIGENISTA e POLIGENISMO .
- Para acesso a informações sobre GEORGES CUVIER E O SEU RACISMO .

MATERIAL DE APOIO:
Acesse aqui para baixar os SLIDES .

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

COMO KARDEC ESTUDOU O ESPIRITISMO

Ao menos de modo mais patente, a partir do ano de 1848, desde Hydesville, fenômenos aparentemente do 'outro mundo' movimentaram Estados Unidos e Europa. Três mulheres, as irmãs Katherine Fox, Leah Fox e Margaret Fox chamaram a atenção do mundo.

Em meados da década de 50 do século 19, um influente educador, autor e tradutor francês, sob o pseudônimo de Allan Kardec, notabilizou-se por se ocupar de fenômenos semelhantes aos que ocorriam com as irmãs Fox.


Longe de ser para ele um trivial entretenimento, tornou-se objeto de profundos estudos, até surgir o que foi conceituado como Ciência Filosófico-Espírita. Esse meticuloso pesquisador constatou que os fenômenos aconteciam em vários pontos do planeta Terra, de modo simultâneo. No fundo descobriu-se que por trás dos fenômenos havia seres inteligentes, cujo objetivo era se comunicar. Eles denominaram a si mesmos como Espíritos.

Para manter o intercâmbio os Espíritos se valiam de certas pessoas que eram usadas nas comunicações em razão de faculdades especiais. Foram chamadas médiuns. Ao analisar as numerosas comunicações percebeu-se uma variedade de informações, individualmente incompletas, mas ao observá-las no conjunto havia complementaridade. Parecia que havia certa divisão de assuntos e temas. Kardec, então, passou a estudá-las, observar certos aspectos.

Sabendo da manifestação simultânea dos Espíritos por todo o Globo terrestre, Kardec criou um Jornal, que ficou conhecido como Revista Espírita. Nela passou a publicar todas as correspondências que recebia, testando teorias, apresentando ensaios, artigos, relatos, opiniões, enfim, transformou-a em uma tribuna livre. Para análise do conteúdo das mensagens lançou mão de um método:
  • Agrupar os fatos dispersos;
  • Verificar sua correlação;
  • Reunir os documentos diversos sobre os temas e assuntos;
  • Reunir as instruções dos Espíritos contidas nas comunicações que surgiam em diferentes pontos do planeta;
  • Agrupar por assuntos;
  • Comparação; e,
  • Análise.

Nada era aceito cegamente, como também eram afastadas as ideias preconcebidas e os prejuízos de seita. Havia, portanto, uma disposição de Kardec para aceitar as evidências da verdade, mesmo contrárias às suas opiniões pessoais. Esse trabalho exigia um critério; era necessário avaliar, segundo o esclarecimento maior ou menor dos Espíritos comunicantes, qual o grau de confiança que poderiam receber.

Para isso Kardec:
1. Diferenciava as ideias sistemáticas, individuais e isoladas daquelas que recebiam a sanção do ensinamento universal dos Espíritos;
2. Distinguia as utopias das ideias práticas;
3. Separava todas as informações dos Espíritos que eram desmentidas pelos dados da Ciência positiva e da lógica;
4. Fazia uso dos erros, das informações trazidas pelos Espíritos, mesmo os da mais baixa categoria, objetivando conhecer o estado do mundo invisível e formar um todo homogêneo.

Uma vez que o ensino dos Espíritos não foi dado de maneira completa em nenhuma parte, em razão de abarcarem grande quantidade de observações e assuntos diversos, requerendo conhecimentos e aptidões mediúnicas especiais, era impossível que estivessem reunidos em um mesmo ponto.

Tratava-se de um ensino coletivo e não individual. Segundo Kardec, os Espíritos dividiram o trabalho e distribuíram os temas de estudo e observação.

O conteúdo do ensino dos Espíritos era transmitido parcialmente em diversos lugares e por uma multidão de intermediários. Surpreendentemente, cada lugar apresentava o complemento daquilo que era obtido em outro e, a partir daí, organizados e coordenados, obtinha-se o conjunto. Esse conjunto é o que constitui a Doutrina Espírita.

Ao redor de Allan Kardec formou-se, pelo curso natural das coisas e das circunstâncias, um centro de elaboração. Tudo passava por um meticuloso controle e, com exame minucioso, tudo era discutido. A lógica era rigorosa. Nada que ferisse a razão e ao bom-senso era aceito de modo passivo ou absoluto. O essencial era manter tudo que não fosse sujeito a erros, contaminação ou mudança. O estudo e observação eram sérios, perseverantes e contínuos.

Certamente, é possível afirmar que as verdades espíritas se constituem em revelações de ordem moral, cuja finalidade é o progresso da humanidade. Estamos longe de abarcar a dimensão do conteúdo da Doutrina Espírita, do mesmo modo estamos longe de divisar a importância e magnitude do trabalho realizado por Allan Kardec.

Uberaba-MG, 22/09/2021.
Beto Ramos

quinta-feira, 16 de setembro de 2021

OBRAS PÓSTUMAS NÃO É UM LIVRO DOUTRINÁRIO


ALLAN KARDEC
E O
CONTEÚDO
DE
OBRAS
PÓSTUMAS


É bastante comum observamos no movimento espírita brasileiro o uso do conteúdo de Obras Póstumas para justificar esse ou aquele posicionamento relacionado à Doutrina Espírita.

Nesse sentido, é lícito indagar: o conteúdo de Obras Póstumas é produto do trabalho de Allan Kardec? Para responder não basta lançar mão de uma opinião pessoal, é preciso deter um conjunto de conhecimentos prévios sobre o Espiritismo.

Em discurso pronunciado no túmulo de Allan Kardec, por ocasião de seu falecimento e diante de seus restos mortais, Camille Flammarion começa dando testemunho 'do relevante serviço que o autor de O Livro dos Espíritos prestou à filosofia, provocando a atenção e a discussão de fatos até então pertencentes ao domínio mórbido e funesto das superstições religiosas". 

Mais à frente no seu longo discurso Flammarion esclarece que Allan Kardec preferiu "constituir um corpo de doutrina moral a ter aplicado a discussão científica à realidade e à natureza dos fenômenos".

Tudo isso para conferir a Allan Kardec o título de "o bom senso encarnado". É, portanto, nesse sentido que pretendemos objetar ao conteúdo de Obras Póstumas ser labor de Kardec para constituir e tomar parte da Doutrina dos Espíritos, uma vez que, como afirma Camille, "o Espiritismo não é uma religião, mas uma ciência".

Afastado o caráter religioso, é preciso recordar que Kardec, na Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, afirmou que "O Livro dos Espíritos contém a Doutrina Espírita; como generalidade liga-se ao Espiritualismo, do qual apresenta uma das fases".

Para fundamentar nossa tese definiremos as palavras Doutrina e Filosofia. Doutrina é o conjunto coerente de ideias fundamentais que compõem um sistema filosófico a serem transmitidas, ensinadas. Filosofia é a ciência que investiga a dimensão essencial e ontológica do mundo real, ultrapassando a opinião irrefletida do senso comum, o qual é escravo da realidade empírica (materialismo).

Na apresentação da obra O Céu e o Inferno por ocasião da notícia de seu lançamento, à guisa de prefácio, na Revista Espírita de setembro de 1865, Kardec esclarece como produzia uma obra. Afirmou que "como nossos outros escritos sobre a doutrina espírita, aí nada introduzimos que seja produto de um sistema preconcebido, ou de uma concepção pessoal, que não teria nenhuma autoridade: tudo aí é deduzido da observação e da concordância dos fatos".

Ali, também, Kardec indicou o conteúdo de cada obra publicada sobre o Espiritismo. O Livro dos Espíritos contém as bases fundamentais do Espiritismo cujo conteúdo é desenvolvido em outras obras. O Livro dos Médiuns e o Evangelho Segundo o Espiritismo se apresentam, sobre os princípios fundamentais, como pontos de vistas especiais, onde se deduzem todas as consequências e todas as aplicações à medida que se desenrolavam pelo ensino complementar dos Espíritos e por novas observações.

Importa remeter o leitor à uma nota de Kardec na Introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, item I, objetivo da obra, em que afirma:

"Poderíamos dar, sem dúvida, sobre cada assunto, maior número de comunicações obtidas numa multidão de outras cidades e centros espíritas, além dos que citamos. Mas quisemos, antes de tudo, evitar a monotonia das repetições inúteis, e limitar a nossa escolha às que, por seu fundo e por sua forma, cabem mais especialmente no quadro desta obra, reservando para publicações posteriores as que não entraram aqui".

Cumpre, ainda, esclarecer qual era o critério de Kardec para publicação do Ensino dos Espíritos. Essa metodologia é que proporciona verificar a autoridade da Doutrina Espírita. Trata-se do controle universal do Ensino dos Espíritos. 

Antes de qualquer publicação Kardec usava o controle da razão, ao qual submetia tudo o que vinha dos Espíritos, sem exceção. O que encontrasse obstáculos no bom-senso, além do controle da razão, também submetia-se ao controle da lógica rigorosa. Mas, tudo isso, afirma Kardec, ainda era insuficiente para muitos casos, uma vez que muitos indivíduos não possuem conhecimento suficiente para o uso desse critério. Depreende-se que a análise das comunicações demanda domínio de várias áreas do conhecimento, bem como da Filosofia e da Lógica.

Por isso, além dos critérios acima, era necessário buscar a concordância no ensino dos Espíritos. Essa concordância requer espontaneidade nas comunicações, cuja fonte deve ser um grande número de médiuns, estranhos uns aos outros, e provenientes de diversos lugares. Outro critério de Kardec é o da prudência na publicação de qualquer informação. Não sendo atendidos todos os passos de seu método, aquilo que ele julgasse necessário publicar era publicado, mas, sempre com a advertência de que o fazia como opinião pessoal individual com a necessidade de comprovação.

Voltemos agora ao conteúdo de Obras Póstumas. Como se sabe esse livro foi publicado 20 anos depois da morte de Kardec. O que era importante publicar foi feito por Kardec em vida, conforme o método acima observado, no tempo oportuno e nas obras mencionadas. Haveria, então, alguma outra obra que Kardec gostaria de publicar?

Segundo Camille Flammarion, antes de morrer Allan Kardec trabalhava numa obra cujo conteúdo trataria de magnetismo e espiritismo. Ora, onde estão esse manuscritos? Por que esse conteúdo não seria mais importante que aquele de Obras Póstumas? Haveria interesses contrapostos à Doutrina dos Espíritos pelos 'continuadores' daquela sociedade criada pelo codificador?

Pois bem. Nada, absolutamente nada, sobre o tema que era estudado por Kardec foi publicado com tal indicação pelos mesmos publicadores do conteúdo de obras póstumas. O conteúdo dessa obra, portanto, seria fruto do trabalho de Kardec? A resposta é NÃO.

O fato de que os textos tenham sido encontrados nas gavetas de Kardec podem possuir valor do ponto de vista da história do espiritismo. Sua divulgação deveria ocorrer na integralidade e não com supressão de partes, pois isto indica interesse escuso ou, ao menos, estranho.

O trabalho de Kardec era organizar as informações advindas dos Espíritos e de interesse geral para a humanidade. O que possui caráter pessoal, segundo Kardec só é de interesse do destinatário. Mas, observamos que Obras Póstumas contém comunicações com a inscrição: particular.

Aliás, boa parte do conteúdo de Obras Póstumas tem natureza pessoal e não coletiva. Questionamos, então.

Por qual motivo Kardec não havia publicado esse conteúdo em vida? Teria dúvidas sobre o mesmo? Seria relevante para o público em geral? Passaram pelo crivo do controle universal? Kardec aguardava confirmação? Seria material para a história do espiritismo? Por que os 'continuadores' não publicaram o material referente a magnetismo e espiritismo tratado no discurso de Camille Flammarion no túmulo de Kardec?

Para comprovar nossa tese verificamos, conforme as imagens a seguir, que o conteúdo publicado em Obras Póstumas sofreu supressão (ou seria adulteração?). A seguir trazemos o conteúdo original , um manuscrito que tivemos a honra de ser agraciados com a imagem pelo Projeto Cartas de Kardec - FEAL, com o qual colaboramos, onde o Codificador conversa com um Espírito acerca de uma possível modificação na obra A Gênese.

Vamos recordar que há uma discussão/denúncia sobre existência de diferenças  retumbantes no conteúdo dessa obra entre a 4ª e 5ª edições, em que se discute a 'autoria' da mudança feita na 5ª edição (para facilitar, apresentamos, também, a tradução do manuscrito, o qual indicamos a leitura atenta):


O 'conteúdo' publicado em Obras Póstumas tratando do assunto desse mesmo manuscrito, referindo à mesma comunicação, além de sua reprodução com supressão de conteúdo, tem a flagrante constatação (na qual o leitor poderá observar por si mesmo, bastando a leitura atenta):




No manuscrito original, advindo do acervo da família de Canuto Abreu (em poder da FEAL), vê-se que a informação é distorcida. É lícito a qualquer estudante indagar qual o objetivo disto. Veja que no original a indicação é que o Espírito e Allan Kardec falavam sobre a Obra A Gênese. Falavam sobre o assunto alteração. Mas, o importante é verificar que estão tratando das 3ª e 4ª edições. Em Obras Póstumas, com o conteúdo modificado e suprimido, reportam-se à "4ª e 5ª". Nesse caso, a polêmica atribuída a Henri Sausse, levantada por Paulo Henrique de Figueiredo e pela FEAL na atualidade, não é produto de pessoas que postulam divisão no espiritismo, mas, seriedade com o conteúdo doutrinário. O mínimo que podemos fazer é atentar para a advertência e para as evidências ora apresentadas.

Convidamos o (a) leitor (a), após comparar os conteúdos ora publicamos, que reflita sobre a nossa afirmação derradeira:

O conteúdo de obras póstumas não é da lavra de Allan Kardec e não pertence ao conjunto publicado que contém a Doutrina dos Espíritos, poderá servir, se os documentos forem publicados integralmente, para compor a história do espiritismo, nada mais.

Uberaba-MG, 16/09/2021
Beto Ramos.







terça-feira, 31 de agosto de 2021

JESUS E A "INTELIGÊNCIA PERFEITA DAS COISAS"

 

Será que existem INCRÉDULOS que ‘pensam’ que acreditam?

Será que ao ‘crer’ em alguma coisa, o ‘crente’ conhece aquilo que diz crer?

Os erros e equívocos cometidos por aqueles que debatem questões, sem delas ter uma cognição ‘a priori’, podem ser computados à conta dos que lhes apresentaram ‘as coisas’ desta ou daquela maneira?

Seria o caso de 'culpa recíproca'?

Allan Kardec, no capítulo 19 da obra O Evangelho Segundo o Espiritismo, no item 7, em que trata da condição da fé inabalável, escreve que “a resistência do incrédulo [...] muitas vezes provém menos dele do que da maneira por que lhe apresentam as coisas. A fé necessita de uma base, base que é a INTELIGÊNCIA PERFEITA daquilo em que se deve crer. E, para crer, não basta ver, é preciso, sobretudo, compreender.

Nesse caso, ao fazer a exposição sobre qualquer assunto e, principalmente quando for transmitir o 'saber', é preciso ter o conhecimento possível, abrangendo todos os pontos acerca do objeto de pesquisa. Tanto o transmissor quanto o receptor precisam compreender o objeto de sua crença.

Na ausência do que Kardec chamou de inteligência perfeita, é possível encontrar algumas deficiências no discurso dos que buscam transmitir algum saber. O processo intelectivo  realizado na aquisição do conhecimento reclama fugir de 'opiniões pessoais' ou preconcebidas sobre as coisas.

Citamos como exemplo as 'interpretações' produzidas sobre informações contidas nos Evangelhos, atribuídas ao Cristo, que, por vezes, são desprovidas da cognição a priori, vez que se desconsidera o método histórico-gramatical. Para exemplificar apresentamos as informações a seguir.

Você já ouviu falar de uma regra chamada do menor para o maior”? Era uma das regras de interpretação das escrituras ao tempo de Jesus. No século I, o mundo judaico as interpretava usando algumas regras principais que foram formuladas por Hillel, conhecido como "o Ancião".

Trata-se do ‘famoso’ princípio kal vahomer - do menor para o maior - ou o “quanto mais”. Vejamos nos ensinos de Jesus alguns exemplos:

“Se Deus alimenta os pássaros e cuida das flores, o quanto mais Ele cuidará do homem!” (Mt. 6:26-30)

Qual a lógica dos ensinamentos contidos nesses versículos e resumidos na frase acima? É que as pessoas são muito mais importantes para Deus do que os pássaros ou as plantas.

Nas suas pregações Jesus usou esse princípio outras vezes. Em Lucas capítulo 23, versículo 31, precedendo à sua crucificação, ele diz:

“Pois, se fazem isto com a árvore verde, o que acontecerá quando ela estiver seca?”.

Parece-nos que se trata do mesmo método de comparação. Vejamos!

Qual é o significado de “árvore verde” nessa afirmação?

Como todos sabemos (não é verdade?), trata-se de um símbolo bíblico clássico de uma pessoa justa.

Então, a interpretação menos equivocada consideraria que Jesus disse:

"Se eu, que sou uma pessoa justa, devo sofrer; o quanto mais vocês, pecadores, terão que sofrer?"

Na tradição judaica do tempo de Jesus, o uso do princípio kal vahomer para a interpretação das Escrituras era muito difundido e muito importante. Aqueles que ouviam seus ensinos compreendiam a lógica de suas comparações e, portanto, tiravam conclusões absolutamente claras.

E você? Acredita que os intérpretes possuem a inteligência perfeita sobre "certas passagens dos Evangelhos" e "conhecem o valor de muitas palavras frequentemente empregadas nos textos, e que caracterizam o estado dos costumes e da sociedade judia naquela época"? (E.S.E., Introdução, item 3, Notícias Históricas).

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Uberaba-MG, 31.08.2021.
Beto Ramos

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

DESEJO E VONTADE SÃO A MESMA COISA?

               


Segundo Spinoza, o filósofo, "não é porque uma coisa é boa que a desejamos, mas, porque a desejamos [a coisa] ela nos parece ser boa".

Ao introduzir o leitor nessa reflexão, desde já, vamos compreender que, ao se falar em Espiritismo, as palavras DESEJO e VONTADE cumprem o seu papel e estão em conformidade com a advertência dos Espíritos quanto a 'nos entedermos quanto às palavras'.

Avançando nessa instrução, eu diria que, para entender é preciso conhecer. O fato é que nós costumamos criar dificuldades quando elas, definitivamente, não existem. É o caso de impormos em 'nosso vocabulário' sinônimos onde eles não existem (ou, simplesmente, não deveriam existir em razão da confusão que provocam).

Não é porque uma definição 'aparece' em um dicionário que devemos fechar os olhos e 'crer cegamente' que o significado 'resolveu' os problemas do entendimento e da compreensão, ambos, processos intelectivos. É um pouco sobre isso que vamos tratar.

Cumpre, todavia, em princípio esclarecer que o substantivo masculino DESEJO possui multiplicidade de sentidos, isto é, trata-se de uma palavra é polissêmica. No entanto, para a nossa investigação vale a pena capturar os sinônimos da expressão desejo em nosso léxico (língua e dicionário). Desejo, então, é tratado como propósito, anseio, sofreguidão, libido, ambição, avidez, cobiça, sede, objetivo.

Por outro lado, temos expressões vocabulares que são tratadas como o contrário de desejo. São elas: isenção, modéstia, desapego, desinteresse, generosidade, despretensão.

Desta maneira, vamos sugerir que a palavra desejo faz muito sentido quando a conectamos com a ideia de IMPULSO.

Além disto, pela observação das expressões que possuem significado contrário, a palavra desejo faz mais sentido ainda quando a afastamos da ideia de RAZÃO.

Pois bem. O problema surge quando, para explicar o desejo, afirmamos que ela se refere a uma ação ou efeito de desejar, de querer ou de possuir vontade. É nesse ponto que propomos essa reflexão. Nosso objetivo é demonstrar que  há diferença entre vontade e desejo. É necessário, então, compreender essa diferença capital.

Ao pesquisar sobre o substantivo feminino vontade encontramos como um de seus sentidos que se trata de um sentimento que leva uma pessoa a fazer alguma coisa, a buscar seus objetivos ou buscar os seus desejos.

Ora, se a vontade me conduz a buscar os meus desejos, a própria definição mostra que são duas coisas distintas.

Entendemos que a VONTADE está relacionada com a capacidade do indivíduo de escolher entre as opções que possui e sobre as quais já amealhou algum entendimento. Nesse sentido, a VONTADE se materializa na FACULDADE DE FAZER OU NÃO FAZER DETERMINADAS AÇÕES.

Você percebe assim, com mais clareza, que a VONTADE está no campo da RAZÃO. A razão pura é aquela que não foi (ou deixou de ser) contaminada pelos desejos e pelos instintos.

A VONTADE ESTÁ NO CAMPO DO CONHECIMENTO ESCLARECIDO, que superou o campo da intuição e do mero entendimento. Trata-se da capacidade de observar, planejar, de criar alternativas e de resolver problemas.

O DESEJO está ligado à IDEIA DE SATISFAÇÃO DA PAIXÃO OU DO PRAZER. Nessa reflexão o desejo está mais próximo do INSTINTO, um IMPULSO interior que provoca a execução de atos inconscientes. Esses atos são praticados devido às necessidades do momento.

Como ensina a filosofia, o instinto (ou impulso interior) nada mais é que uma força que se dirige a um fim. Esse fim, ou objetivo, é uma fonte de satisfação (consciente ou inconsciente), às vezes até reprimidapara o ser que o experimenta. 

O desejo é uma necessidade instintiva do corpo. A vontade é uma decisão deliberada que representa uma ação vigorosa e determinante da mente sobre o corpo. Essa decisão é baseada na consciência, na sabedoria e na razão. A VONTADE, como fruto do CONHECIMENTO ESCLARECIDO, compreende a ocasição em que afloram os desejos e os instintos e os dirige.

O Espiritismo tem como base o princípio da evolução perpétua e continua do Espírito. Esse, foi criado por Deus simples e ignorante. A evolução do Espírito na fase humana começa, portanto, com a nulidade moral, mas perfectível e dotado de atributos.

Essas faculdades, ou potencialidades do Espírito são: instinto, pensamento, inteligência, livre-arbítrio e vontade. Todos esses atributos tornam o Espírito apto a intuir, imaginar, conhecer, entender, julgar, saber e compreender.

A Doutrina Espírita supera a questão meramente corporal e ensina que o Espírito imortal é o titular de todos esses atributos que parte da ciência conferia somente à matéria. Nesse sentido, o processo de aquisição do conhecimento e a própria evolução ocorre por meio das sucessivas reencarnações.

Nenhum dos atributos do Espírito são utilizados com todo o seu potencial e plenamente. À medida que a evolução do Espírito ocorre, eles são desenvolvidos.

Para refletir sobre isso vamos trazer algumas afirmações de Allan Kardec sobre as Diferentes Ordens de Espíritos, quanto à categoria dos Espíritos segundo suas três grandes divisões ou Escala Espírita, quando trata do tema "Dos Espíritos", na Segunda Parte, Capítulo 1 (O Livro dos Espíritos, Questão 100):

"Os Espíritos, em geral, admitem três categorias principais, ou três grandes divisões:

a) Na última, a que fica na parte inferior da escala, estão os Espíritos imperfeitos, caracterizados pela predominância da matéria sobre o espírito e pela propensão para o mal;

b) Os da segunda se caracterizam pela predominância do espírito sobre a matéria e pelo desejo do bem: são os bons Espíritos.

c) A primeira, finalmente, compreende os Espíritos puros, os que atingiram o grau supremo da perfeição.

Mais à frente, na Questão 101, veremos que os Espíritos da Terceira Ordem ou Imperfeitos se caracterizam por todas as paixões, que são consequências das imperfeições (ignorância, orgulho e egoísmo), os quais possuem a INTUIÇÃO, mas não possuem COMPREENSÃO e a sua INTELIGÊNCIA pode ou não se aliar à maldade e à malícia. Em alguns deles há, inclusive, mais falta de reflexão sobre as coisas do que a própria maldade. A matéria predomina sobre o Espírito, o qual está mais próximo do INSTINTO e, ainda, muito longe da razão.

A Segunda Ordem ou Bons Espíritos, são caracterizados por qualidades para o bem segundo o que tenham adquirido nas áreas da ciência, da sabedoria e da bondade. Saber e qualidades morais já aparecem naqueles que se adiantaram mais nessa classe. Mas, como mostram os Espíritos, DESEJAM O BEM, pois, ainda apresentam hábitos, manias e lingugem, etc., próprias de Espíritos em evolução.

Finalmente, na Primeira Ordem ou Espíritos Puros vamos encontrar aqueles sobre os quais a matéria NÃO EXERCE NENHUMA INFLUÊNCIA. São aqueles que já atingiram SUPERIORIDADE INTELECTUAL E MORAL ABSOLUTA em relação aos demais Espíritos das outras ordens. São portadores da mensagem de Deus, comandam os Espíritos que lhes são inferiores e são gratos e felizes com suas tarefas e missões. Parece-nos que superaram o DESEJO DO BEM, pois, REALIZAM O BEM PELO BEM por atos de sua própria VONTADE, guiada pelo ato do dever.

Não é difícil, agora, compreender a diferença entre DESEJO E VONTADE.

Uberaba - MG, 09 de Agosto de 2021 (modificado em 11/08/2021 - 16h00).

Beto Ramos.

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