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INTRODUÇÃO
PRIMEIRA PARTE – NECESSIDADE DE CONFIRMAÇÃO
– FONTES PRIMÁRIAS
Um exemplo interessante é a palavra castigo, muito utilizada pelos tradutores quando vertem do francês para o português. Nesse caso, vamos encontrar no original a questão 263, onde:
“L'Esprit fait-il son choix immédiatement après la mort? Non, plusieurs croient à l'éternité des peines; on vous l'a dit: c'est un châtiment”.
José Herculano Pires, na 70ª Edição, 02/2013, de O Livro dos Espíritos traduz a palavra châtiment como “castigo”. O mesmo autor, na mesma edição da tradução, verte a palavra frappe-t-il, também, como “castigo”.
Interessante notar que o significado para a primeira é punição e para a segunda temos atingir. Não é interessante pensar que se a ideia fosse, realmente, de “castigo”, o Codificador, como pedagogo não iria deixar isso bem claro? Mas, pesquisando o original o que temos é a dúvida quando comparamos com a ideia trazida pelo tradutor. Aqui não se discute a intenção do tradutor, a idoneidade do tradutor, a índole do tradutor, mas, a harmonia da obra codificada.
Mais sobre essas expressões francesas e suas possíveis traduções para o português você encontra nesse outro artigo aqui.
Recordamos que o centro da teoria espírita é a AUTONOMIA MORAL DO ESPÍRITO, fugindo das teorias que, refutando o livre arbítrio, afirmavam a MORAL HETERÔNOMA. Neste sentido, é importante refutar a palavra “castigo”, voltar ao sentido original e harmonizar o conjunto para que a tradução não perca a essência.
Ocorre o mesmo com outras teorias que temos encontrado. Nosso objetivo aqui não apontar que A ou B estejam errados. O importante é chamar a atenção para essas questões que se mostram de importância elevada para a compreensão correta da teoria espírita. Tudo no sentido de que por qualquer motivo sejam criadas teorias que não estão presentes na base fundamental do edifício espírita.
SEGUNDA PARTE – O PROBLEMA DAS TRADUÇÕES
O problema está nas que objetivam uma compreensão imediata. Essa tradução elimina tensões, repetições e redundâncias, altera estruturas frasais, usa vocabulário mais simples e, por vezes, supre palavras “faltantes”. Ora, eis aí um problema capital: quem é o autor original dessa obra?
TERCEIRA PARTE – O PERISPÍRITO
“O
corpo é, ao mesmo tempo, invólucro e instrumento do Espírito e, à medida que
este adquire novas aptidões, reveste-se de um corpo apropriado ao novo gênero
de trabalho que deve realizar, como se dá a um operário ferramentas menos
grosseiras à medida que ele seja capaz de fazer uma obra mais delicada” [3].
Não há dúvidas de que o corpo, envoltório do Espírito, é o seu instrumento de manifestação no mundo material ou, como mostra a citação acima, é o seu instrumento de trabalho. Mas, fica a indagação: se todas as coisas estão sujeitas à Lei do Progresso como se elabora o corpo físico pelo qual o Espírito irá se manifestar? Então, o Codificador vai direto ao ponto e afirma:
“Para
ser mais exato, é preciso dizer que é o próprio Espírito que elabora seu
envoltório e o adapta às suas novas necessidades. Ele aperfeiçoa,
desenvolve e completa seu organismo à medida que experimenta a necessidade de
manifestar novas faculdades. Em uma palavra, ele o molda de acordo com sua
inteligência” [4].
É ainda nesse mesmo texto que Allan Kardec afirmará que Deus fornece os materiais e o Espírito o usa, o que explica o estilo especial que o caráter do Espírito imprime aos traços da fisionomia e as maneiras do corpo. Interessante salientar que o Espírito, para o seu adiantamento, usa suas faculdades que são rudimentares no princípio e se recobre de um envoltório corporal adequado ao seu estado de infância intelectual, deixando-o para se revestir de outro à medida que suas forças vão aumentando. Mas, é no item 17, Encarnação dos Espíritos, que a obra A Gênese trará muitas informações importantes que devemos nos apropriar para esse ensaio.
“Por sua essência espiritual, o Espírito
é um ser indefinido, abstrato, que não
pode ter uma atuação direta sobre a matéria, sendo-lhe
necessário um intermediário, que é o
envoltório fluídico, que faz, de certo modo, parte integrante do Espírito,
revestimento semimaterial, isto é, pertence
à matéria por sua origem e à espiritualidade por sua natureza etérea” [5].
Interessa notar que Kardec afirma que é o perispírito que torna o Espírito (um ser abstrato), um ser concreto, definido e perceptível pelo pensamento, apto a atuar sobre a matéria tangível. Daí se conclui que o Espírito age sobre a matéria por intermédio do perispírito. Importa não deixar escapar uma explicação, também, muito importante, na qual Kardec ensina que o perispírito:
“Durante sua união com o corpo, é o veículo do pensamento do Espírito para transmitir movimento às diferentes partes do organismo, as quais atuam sob o impulso de sua vontade, e para repercutir no Espírito as sensações produzidas pelos agentes externos. Têm por fios condutores os nervos, como no telégrafo o fluído elétrico tem por condutor o fio metálico” [6].
Passamos, agora, para o ponto crucial de nosso ensaio em que vamos citar o item 18 da Obra A Gênese – Capítulo XI – Gênese Espiritual, cujas informações são de grande valia para nossa compreensão acerca da questão: o perispírito modela o corpo físico? Ora, como mencionamos no princípio, não é incomum ver afirmações dessa natureza. Está ela de acordo com a Codificação? Vejamos:
“Quando o Espírito tem de encarnar em um corpo humano em vias de formação, um laço fluídico, que é apenas uma expansão de seu perispírito, liga-se ao embrião, para o qual ele se acha atraído por uma força irresistível desde o momento da concepção” [7].
Necessário atentar para a informação: o corpo humano está em “vias de formação” e o embrião atrai o Espírito por força irresistível para esse. O corpo, nesse caso, atrai o Espírito e a ligação ocorre pelo seu veículo de pensamento que transmite movimento para as diferentes partes do organismo em formação.
“Sob a influência do princípio vital
material do embrião, o perispírito, que
possui certas propriedades da matéria, se une molécula por molécula com o
corpo que se forma” [9].
Importante ressaltar antes de prosseguir que é necessário compreender que, ao tempo de Kardec, não era amplamente divulgado o fato de o corpo físico se constituir de células, como unidades fundamentais da vida pluricelular (conf. nota 129 da tradução de A Gênese ora utilizada – p. 228). Então, é nesse sentido que se deve compreender tal ligação.
Ora, aqui temos um manancial importante para meditarmos, pois, é o próprio Codificador quem vai dizer: “por isso, podemos dizer que o Espírito, por intermédio do Perispírito, se enraíza nesse embrião, como uma planta na terra. Quando o embrião está inteiramente desenvolvido, a união está completa, e ele nasce para a vida exterior” [10].
Destarte, cumpre recordar que o perispírito tem origem material e natureza espiritual, mas, desprovido de vida, pois, como ensina o Codificador, trata-se de “veículo de transmissão do pensamento do Espírito para transmitir movimento às diferentes partes do organismo, as quais atuam sob o impulso de sua vontade[11]”. Em se tratando de modelagem do corpo, nos parece que Kardec foi enfático em declarar que essa ação é do Espírito sobre a matéria. Seu pensamento é transmitido pelo perispírito.
Para nossa análise é compreensível que o caráter do Espírito possa imprimir um estilo todo especial aos traços da fisionomia e às maneiras do corpo, conforme ensina Allan Kardec. Todavia, é possível permanecer a dúvida: como isso ocorre se o Espírito sofre perturbação ao iniciar o processo reencarnatório por meio da ligação feita pelo laço fluídico que o une ao corpo? Essa questão é prontamente respondida pelo Codificador, senão vejamos:
“Preso ao laço fluídico que o une ao embrião, a perturbação se apodera dele, aumentando à medida que o laço se estreita e, nos últimos momentos, o Espírito perde a consciência de si mesmo, não sendo, jamais, testemunha consciente de seu nascimento" [12].
Temos a seguinte situação: o feto atrai o Espírito que a ele se liga na concepção pelo laço fluídico. Se, é por esse laço que o Espírito manifesta a vontade para o corpo através de seu pensamento, lícito será avaliar que do mesmo modo em que o caráter do Espírito imprime um estilo especial aos traços da fisionomia e as maneiras do corpo, envia, também, pelo pensamento todas as informações que serão usadas pelos corpúsculos celulares que estão formando o corpo físico e tal processo não é lento ou demorado, pois, para os Espíritos o pensamento é tudo.
Não é plausível confundir perturbação com a total perda de consciência, e nem esquecer que o primeiro ensinamento quanto esse tema em que se reporta o Codificador é que é o Espírito quem elabora seu organismo, isto é, ele molda o corpo físico (item 11, Capítulo XI – Gênese Espiritual – A Gênese). Neste sentido, plausível considerar que ele o faz por intermédio do veículo de seu pensamento: o perispírito. Mas, esse nada faz por “vontade própria”, é instrumento semimaterial criado pelo Espírito, retirado do fluido cósmico, destrutível e trocado pelo Espírito à medida que evolui.
Mas, teríamos nós outras fontes na Codificação onde buscar corroborar com a impossibilidade de ocorrer o contrário, isto é, o perispírito moldar o corpo físico sem a vontade manifesta pelo pensamento do Espírito? Eis que surge na Tradução da Revista Espírita de Maio de 1858 uma explicação que pode confundir o leitor. Vejamos:
“Mas essa matéria sutil não tem a tenacidade nem a rigidez da matéria compacta do corpo; é se assim nos podemos exprimir, flexível e expansível; por isso a forma que toma, embora calcada sobre a do corpo, não é absoluta” [13].
Vejamos o significado da expressão calcada, do verbo calcar. Segundo nosso Dicionário Escolar da Língua Portuguesa LUFT da editora ática (2005), temos:
CALCAR: pisar
com os pés; esmagar; comprimir; Decalcar, modelar;
Pensamos que essa expressão pode confundir e levar o leitor a considerar que o perispírito modela o corpo físico, uma vez que é possível encontrar essa expressão em nosso vernáculo conforme demonstrado. Contudo, neste ensaio buscando-se no original em Francês da Revue Spirite Mai 1858 vamos encontrar o seguinte:
“c'est
pourquoi la forme qu'elle prend, bien que calquée sur celle du corps, n'est pas
absolue;”
Que, para nossa surpresa, vamos encontrar uma informação que faz toda a diferença para nossa compreensão. Vejamos:
Chama nossa atenção a tradução que nos induz pensar que o perispírito é apertado sobre a forma do corpo, modelando-o, quando, na tradução ora apresentada temos que a forma perispiritual é modelada na forma do corpo físico.
É assim que nós entendemos neste ensaio, pois, há uma sensível diferença entre “apertar a forma perispiritual sobre a forma do corpo” (que induziu a ideia de ‘perispírito modelando o corpo') com 'a forma perispiritual é modelada na forma do corpo'.
Corrobora com nossa teoria, segundo o até aqui apresentado, uma Tabeleau de l’avie Spirite (Quadro da Vida Espírita) onde o Codificador nos apresenta a seguinte afirmação:
Tradução:
“este
corpo não possui nossos órgãos e não pode sentir todas as nossas impressões”.
Ora, se fosse, digamos assim, o modelador do corpo físico, seria lícito raciocinar que seriam “impressos” todos os órgãos também. Ocorre que a frase anterior a essa ora mencionada elucida, a nosso ver, o conjunto de indagações, uma vez que no original temos:
“o
invólucro semimaterial do Espírito constitui uma espécie de corpo de forma
definida e limitada, análoga à nossa”.
Segundo o mesmo dicionário anteriormente citado vamos encontrar para análogo (a), expressão relativa à analogia, o seguinte significado: semelhança entre duas coisas sob certos aspectos. Análogo não é, sem qualquer dúvida, a mesma coisa. A analogia citada é quanto a se tratar de uma forma definida e limitada, contudo, o corpo físico é de matéria rígida enquanto o perispírito é flexível e expansível.
Em O Livro dos Espíritos, na Questão 93, há o seguinte ensinamento: o Espírito é envolvido por uma substância vaporosa para a visão dos encarnados ao mesmo tempo em que é grosseira para visão dos Espíritos. Na Questão 95 aprendemos que o perispírito possui a forma determinada e perceptível que o Espírito, por seu arbítrio, lhe atribuir.
Neste caso, se cada Espírito atribui, por sua livre escolha, a forma que desejar ao seu perispírito, não faz sentido pretendermos que o perispírito possua órgãos tal qual o corpo físico, o qual possui rigidez para sustentar sua organização densa.
Para demonstrar que equívocos podem ser cometidos sem uma análise profunda trazemos à colação uma pergunta e sua resposta constante da RE/JUL/1858, edição da FEB (em PDF), pg. 279, onde o diálogo se desenvolve como abaixo:
Ora, a razão nos diz que o Codificador, quando explica que as percepções do Espírito não ocorrem por meio de uma parte limitada de sua individualidade, como acontece com o corpo físico que possui tais partes individualizadas (ouvir, ver, sentir, etc.), traça uma diferença capital entre perispírito e corpo físico e suas respectivas constituições.
Produzido como ensaio, não se objetivou neste artigo esgotar o tema, mas, provocar no leitor a vocação para a pesquisa.
Uberaba-MG, 18/11/2021
Beto Ramos.
[1]
DIAS DA SILVA, Cássio Murilo. Leia a
Bíblia como literatura. São Paulo: Edições Loyola, 2007.
[2]
DIAS DA SILVA, Cássio Murilo. Leia a
Bíblia como literatura. São Paulo: Edições Loyola, 2007.
[3]
KARDEC, Allan. A Gênese. (cf. a 1ª edição francesa de 1868). Trad. Carlos de
Brito Imbassay. 2ª Edição. FEAL: Guarulhos-SP, 2018, pg. 224/225.
[4]
KARDEC, Allan. A Gênese. (cf. a 1ª edição francesa de 1868). Trad. Carlos de
Brito Imbassay. 2ª Edição. FEAL: Guarulhos-SP, 2018, pg. 225.
[5] KARDEC,
Allan. A Gênese. (cf. a 1ª edição francesa de 1868). Trad. Carlos de Brito
Imbassay. 2ª Edição. FEAL: Guarulhos-SP, 2018, pg. 227.
[6] Idem,
pg. 228.
[7]
Ibidem.
[8] KARDEC,
Allan. A Gênese. (cf. a 1ª edição francesa de 1868). Trad. Carlos de Brito
Imbassay. 2ª Edição. FEAL: Guarulhos-SP, 2018, pg. 228.
[9]
Idem.
[10]
Ibidem.
[11]
Ibidem.
[12]
Idem, pg. 229.
[13]
Revista Espírita. Maio de 1858. Teoria das Manifestações físicas. Tradução de
Evandro Noleto Bezerra. FEB (em PDF), pg. 194/195.